O lugar da conversa
O ajustamento económico tem destas coisas. Umas vão outras vêm. De um dia para o outro, melhor dizendo, numa semana, desinstalamos o telefone fixo da PT e mandamos vir outro móvel e da concorrência. Quem vai ao ar perde o lugar, dissemos os três cá em casa.
Por minha iniciativa, dirigimo-nos a uma loja e quisemos saber como proceder. Foi tudo muito fácil. Eram só facilidades. A aquisição do novo aparelho fez-se logo ali e veio connosco acondicionado numa caixa de cartão.
A substituição ficou agendada para um sábado. Enquanto não chegavam os técnicos foram sendo enviadas SMS a anunciar, para breve, a sua presença na nossa residência.
Chegaram, confirmaram os dados indicados na SMS e, em dois tempos: um, para se inteirarem das tomadas e, outro, para arrumarem a tralha, pois a instalação durou poucos minutos, despejaram o nosso antigo hóspede.
O novo inquilino passaria a ter o posto de abastecimento de energia no nosso apartamento e ficaria o resto do tempo no andar da mãe dela, mesmo por debaixo do nosso.
Nos dias seguintes, quando me dirigi ao piso inferior, estranhei ver a mãe dela sentada no sofá a falar ao telefone com as amigas do lado de lá, tal e qual como fazia anteriormente. Ali, naquele sítio, bem junto ao antigo poiso do telefone fixo, a conversa decorria como se nada fosse.
Afinal, o dom da mobilidade do aparelho que (julgávamos nós) iria alterar o lugar do diálogo com os ausentes, não tinha pernas para andar. Por isso, em respeito pelo lugar natural das coisas, o extremo do sofá deixou de ser apelidado como o lugar do telefone e passou a ser designado como o lugar da conversa.
A crise tem destas descobertas.
Vila Nova de Gaia, 7 de julho de 2012