Já não vínhamos aqui há mais de quatro anos. Da última vez, eramos cinco, hoje somos quatro e o rapaz já me olha olhos nos olhos.
No exterior e no interior o reboco está sujo, mas a beleza mantém-se, mais no interior para ser sincero.
Dentro, a luminosidade morna é relaxante e convida à reflexão, ao contrário de certos templos em que a penumbra, às vezes próxima da escuridão (exemplo da Sé de Braga, igreja da Lapa e dos Congregados no Porto), é intimidatória.
As paredes e tecto lisos, sem imagens, forçam à introspeção.
Mas o melhor de tudo são as cadeiras, em oposição aos tradicionais bancos pesados[1] e longos, em que nunca sabemos se pode caber ainda mais uma pessoa. Aqui cada um tem a sua cadeira. A cor crua da madeira, a elegância e a fragilidade das pernas e encosto, obrigam-nos a tratar bem delas, a ter cuidado com elas. Durante a cerimónia nunca nos esquecemos delas, pois são vários os momentos em que nos levantamos e nos sentamos, e não podemos correr o risco de nos sentarmos mal. Estamos, assim, a modos de um olho no celebrante e outro na cadeira, não vá o diabo tecê-las.
Fiquei junto à janela, a única ao nível do nosso olhar. Confesso que aquele rasgo para o mundo me distraiu, logo eu que sou tão dado às contemplações de serras e vales (é mais forte do que eu).
Em resumo: vimos uma obra do género humano que é de génio[2].
Fornos (Marco de Canaveses), 1 de setembro de 2013.
[1] O cúmulo da aberração deste tipo de bancos encontra-se na igreja de Santo Ovídeo, em Vila Nova de Gaia, aliás todo o edifício é disforme e agreste. O que salva o templo é a tapeçaria de Fernando Lanhas.