O banco duplo
Aquele momento costuma ser mágico, relaxante e inspirador. Cheguei e escolhi a parte do banco duplo virada para a esplanada. Nas minhas costas estavam dois homens a conversar. Iniciei a leitura pelo jornal. A revista fica sempre para último. A folhas tantas, apercebi-me que o banco se abanava. De imediato pensei que estaria manco.
Talvez tivesse uma perna mais curta que as restantes. Mas o movimento repetia-se e agora de modo mais rápido. Concentrei-me e senti que os solavancos eram provocados pelo meu vizinho. O homem, já de idade avançada, tinha com certeza um problema de saúde.
Eu podia mudar de banco, mas optei por ficar. Só que não fiquei por ali. Deixei-me embalar pelos pensamentos que me conduziram ao alto mar do futuro. E vi claramente visto a possibilidade de ficar assim: vacilante.
Desperto para o jornal, passei a aceitar com naturalidade aquele balançar. Conclui que, afinal, estávamos os dois no mesmo barco. E desejei que aquela doença, se algum dia aportar na minha ilha, me permita flutuar com dignidade e, se calhar, descobrir novos mundos.
Quando cheguei a casa e me perguntaram onde estive, respondi:
- Estive no Intervalo… da realidade!
Publicado in Histórias mal contadas