Comentário:
É a prova de que os artistas são inventores de uma realidade alternativa à convencional e que muitas vezes pode ser materializada, passando depois a se converter em convencional. Do mesmo modo, os inventores/cientistas também são artistas porque ajudam a transformar a realidade. O que hoje achamos normal/banal (roda/fogo, etc) foi uma grande invenção há milhares de anos feita por um artista/inventor. Parabéns Raúl Zuleta!
Por parte da autarquia, a obra, de avultados investimentos, estava licenciada, os requerentes pagavam taxas, estava tudo conforme a lei do município. Esqueceu a autarquia (esquece a maioria) que existe a lei do Estado, superior à do município e com regulamentação específica sobre a matéria (lei especial derroga a lei geral). Se não houvesse IGESPAR o aquário nunca seria desmontado.
Este caso deve servir para todos nós repensarmos a atual tendência de municipalização de serviços do Estado central.
Aliás, há sinais em sentido contrário.
Por exemplo, a fiscalização e instrução dos processos de contraordenação da lei de defesa da floresta, passou para a competência exclusiva da GNR, face à ineficiência dos serviços municipais.
É que sempre que existe um conflito entre um particular e o Estado, por regra, o município (independentemente dos partidos) intercede junto deste a favor do primeiro. Sucedeu nas demolições na Arrábida e na Ria Formosa.
Quem vai permitir sancionar os potenciais votantes? Quantos embargos e consequentes demolições promovidos pelos municípios ocorreram na última década?
Por isso, a concretizar-se, a municipalização da educação será mais outro erro que se irá cometer. Aqui é caso para dizer: dividir para reinar.
A propósito, já alguém pensou no absurdo de haver no país tantos regulamentos de taxas municipais quantos os municípios. Mesmo admitindo-se que muitos regulamentos são réplicas de outros, é crível que o cálculo da taxa devida pela ocupação de um lugar na feira seja diferente de município para município?
E que dizer do Código Regulamentar do Município do Porto? Um autêntico monumento jurídico para gerir um pequeno território.
Os municípios são autênticos Estados dentro do Estado, o que gera confusão, discricionariedade, desperdício de meios humanos e financeiros e mais burocracia, quando não acompanhada da injustiça.
A municipalização dos serviços centrais é o resultado de uma troca de favores políticos que correspondeu, na fundação da nacionalidade, à concessão de forais. O fenómeno repete-se.
Concluindo, quanto mais poderes os municípios subtraírem ao Estado, mais fraco será o Estado. Isto já para não falar da conversão de atividades de natureza pública em áreas de negócios privados. Como sejam, a título de exemplo, o exercício do poder de autoridade do Estado por privados (fiscalização dos parquímetros) e o exercício do poder de autoridade a favor de determinados privados (os gratificados da PSP).
Para quem se habituou a ver o prédio da esquina todo degradado, dar de caras com uma fachada limpa provoca uma sensação muito agradável. A cor em tons quentes também ajuda. Mas é essencialmente o aspeto de novo, de asseado, que nos afeta positivamente.
Avenida Rodrigues de Freitas, Porto, 12 de outubro de 2015.
Para quem é intolerante, como eu, a lixo, desordem, desleixo, percorrer, desde março de 2015, o lanço da A1 entre Santo Ovídeo e os Carvalhos (Vila Nova de Gaia), nesta fase de obras, faz subir a dopamina. E muito!
Santo Ovídeo - Carvalhos, Vila Nova de Gaia, 3 de outubro de 2015.
Vinha de Tabuaço pela EN 222 em direção ao Peso da Régua. Do meu lado direito corria o rio Douro. Ao chegar às pontes (A24+EN2+estrada desativada) que ligam aquela cidade e o sul do rio Douro, o meu pensamento lógico encaminhou-me para a próxima saída à direita. Digo à direita para alcançar o outro lado do rio, a cidade do Peso da Régua. Só que nada disso aconteceu. Tive de virar à minha esquerda e depois outra vez à esquerda para, finalmente, seguir em frente sobre a ponte (EN2).
Travou-se naquele percurso uma luta entre a lógica do meu pensamento que não aceitava a insistência na viragem à esquerda (duas vezes) e a sinalização que me guiava (a realidade dos factos) para a esquerda.
Por um lado, o pensamento lógico dizia-me que estava errado, que não podia ser, por outro os sinais de orientação obrigavam-me a seguir naquele sentido, o único sentido de regresso a casa.
No final venceram os sinais. Mas não fiquei convencido. A minha lógica não se deu por vencida.
Aqui relembro as aulas de filosofia sobre Emanuel Kant. É indiscutível que possuo uma categoria a priori (pensamento lógico?) que me orienta num certo sentido, ou seja, se venho do lado direito da estrada e pretendo atingir a margem do rio sita do meu lado direito então tenho que iniciar a marchar de travessia do meu lado direito (talvez por ser o caminho mais curto?).
Só que a realidade contradiz aquela categoria.
Quem está errado: a categoria à priori ou a realidade?
Só pode ser a realidade.
Em conclusão: trata-se de uma solução rodoviária incongruente, que a escassez de recursos financeiros ou a falta do engenho humano assim obrigaram a materializar naquele local para mal da harmonia da nossa lógica mental.
NOTAS FINAIS:
Peso da Régua, 11 de setembro de 2014.
O que para mim não passava de um desafio à autoridade, acabou por se revelar um caso de saúde pública.
Durante meses questionava-me como era possível o proprietário de um estabelecimento de velharias ter a carrinha diariamente estacionada em frente à garagem, ocupando um espaço superior ao correspondente à entrada daquela, sem que fosse interpelado pelas autoridades (polícia municipal ou de segurança pública).
O meu raciocínio era o seguinte: beneficiando o dono do estabelecimento do direito à rampa e consequente proibição de terceiros de aí estacionar, aproveitava-se daquela vantagem (impossibilidade de estacionamento) para fazer uso privativo do domínio público (espaço em frente à rampa) sem pagar qualquer compensação (taxa).
Para mim, estar-se-ia a pagar somente a taxa devida pela implantação da rampa (disponibilidade do acesso à via pública), mas usufruindo, ininterruptamente (a carrinha estava sempre ali estacionada) do espaço público que lhe permitia aceder à garagem, que, afinal de contas, estava preenchida com velharias, não permitindo o estacionamento no seu interior daquela carrinha ou de outro veículo.
Como a carrinha já constituía um prolongamento do interior da garagem, uma vez que também albergava velharias, o estabelecimento comercial expandia-se até ao domínio público.
Isto era o que eu pensava, mas pensava mal.
Num domingo à noite (1 de junho?), ao passear com o rapaz no local, deparei com o espaço público situado em frente à garagem e reservado ao estacionamento, delimitado por barreiras de proteção da C. M. de V. N. de Gaia.
Vim a saber, por intermédio dos condóminos do prédio ao qual pertencia a garagem, que no dia seguinte os serviços camarários iriam proceder à remoção de todos os objetos que o inquilino tinha depositado durante anos no interior daquela.
Em conclusão: o que se via à entrada da garagem era só uma amostra, pois o interior, constituído por cerca de 690 m2, encontrava-se totalmente atulhada com velharias (móveis, candeeiros e outros objetos de utilização doméstica).
Além disso, e ao contrário do que supus, a rampa já havia sido removida, dado que a garagem deixara de ter a utilidade normal (estacionamento de veículos) e passara a estabelecimento comercial. Nunca reparei na rampa. Só atentava no pavimento em blocos de pedra que ligavam a garagem à guia do passeio.
Os condóminos tinham razão: estávamos perante uma grave ameaça à segurança de pessoas e bens, atenta as características de combustível dos objetos que recheavam a garagem.
Na segunda feira seguinte (2 de junho?) começou então a limpeza da garagem, que ainda decorre, por sinal, e que o rapaz nos vai relatando quando chega a casa depois das aulas. No início, segundo ele, foi um grande aparato de polícias de ambos os lados da rua, mas aparentemente desnecessário, uma vez que o inquilino da garagem se mostrou colaborante no acarretar dos objetos para os contentores que estavam dentro das ditas barreiras de proteção.
Do que vejo, a carrinha já desapareceu, contudo as barreias ainda se mantêm. O despejo está para durar, presumo.
Analisando o caso à distância, acabei por passar do âmbito jurídico da situação (taxas e utilização privativa do domínio público), para o âmbito da saúde pública e privada.
Agora questiono-me: não estaremos, afinal, perante um caso de acumulação compulsiva?
Certo certo, é que nos últimos dias, e agora mesmo durante a redação deste texto, quando represento a limpeza da garagem e do espaço em frente à mesma, a produção da dopamina aumenta transmitindo-me uma sensação de bem estar, de limpeza, para ser mais preciso.
Vila Nova de Gaia, 16 de junho de 2014.
A solução técnica para evitar a nidificação das cegonhas nos pórticos foi muito simples.
Mais um momento de prazer: confrontar o absurdo do passado com a limpeza[1] do presente.
Sob os pórticos da A25 em Angeja, Aveiro, 22 de maio de 2014.